Paris se veste aos poucos de primavera que, lenta e suavemente, vai colorindo os canteiros com flores sorridentes e verdejando árvores aqui e ali. Árvores que, mesmo nuas e pálidas, eram belas esculturas esculpidas pelas mãos anônimas da natureza. Agora, vestidas, são pinturas impressionistas distraídas na paisagem.
Por onde caminho, seguem-me o vulto, o passado e a história. Estou impregnada da formosura que suave esbarra em mim. Adentro esse quadro ousadamente. Imiscuo-me nessa moldura que outrora ou em alguma vida me esperava e a quem eu tanto queria. Num instante, somos a simbiose da chegada e da partida... Não temos muito tempo e a urgência me consome: o tempo fluídico dos amantes. Sou a ansiedade tocando o belo. Meus olhos anotam, minha alma fotografa e eu flutuo... De onde vem essa emoção que me estremece em soluços inaudíveis? Ou seriam sussurros dos personagens que me acompanham?
O Sena é uma avenida imensa de águas cristalinas. Perspicaz, o vento mergulha velozmente em suas profundezas e emerge lépido e provocante, borrifando os meus cabelos e impregnando-me do perfume das possíveis verbenas-rosas, incrustadas no muros que escoltam sua margem. Posso escutar o som dos pássaros misturado ao vozerio dos passantes, sem prescindir do esplendor que me rodeia. Dos paralelepípedos pequeninos e mágicos de Montmartre à suntuosidade proposital de Versalhes, sigo absurdamente em êxtase, subindo e descendo escadarias, alçando torres, ajoelhada sob vitrais que se movem na minha imaginação e me entrelaçam.
O tempo escoa implacavelmente zombeteiro, digladiando com vontades e compromissos. Mas já não importa, e escolho ficar.
Num instante, sou parte desse mosaico multicor e detenho-me no esboço dos vitrais, consentida, permitida, desenhada...
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