sábado, 15 de setembro de 2012

O entardecer (crônica)


     O amanhecer é companheiro das nuvens algodoentas e encarneiradas, mas o entardecer só pode ser o aconchego da poesia. Pouco a pouco, vislumbra-se o amarelo destonalizado do sol, já sem força, despedindo-se, com muita pena e saudoso, do dia que se vai... Breve, a nuvem translúcida, feito cortina de voal, há de deitar sua sombra, cinzenta e fina, quer sobre o mar, quer sobre montes e campinas extensas e verdejantes. E logo descerá, devagarinho e mansa, para se aconchegar à terra.
      No entardecer, aves e pássaros se alvoroçam num bailado estonteante de volta aos seus ninhos, porque a noite, silente e misteriosa, já se avizinha. O alto de uma montanha escarpada e uma árvore frondosa e forte serão o lugar ideal para um abrigo. Os galhos, cúmplices dessa ânsia por um refúgio, abrem-se acolhedores e lhes acenam, feito braços imensos e despojados para os receber, protetores e em segurança.
     O entardecer são as trombetas dos anjos esvoaçantes, lépidos e inquietos que vêm anunciar a noite.
     O entardecer é sempre manso e risonho, eu até juraria que é o sorriso aquiescente de Deus.
     O entardecer pisca os olhos para os enamorados, ouve suas confidências e todas as juras de amor, no morno da tarde.
      Sobre os morros, o entardecer coroa de brilho multicolorido o mundo, e quando estende por cima do mar o seu reflexo, espraia a imagem mais bela que o pintor, sensibilizado e atento, reproduz e transforma na sua obra-prima.
     E a alma do poeta, seduzida e reverenciada, desperta e voa ao redor da poesia...      

                                        

(crônica escrita ao som de "Sonata ao Luar" de Beethoven)

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